Friday, December 23, 2011

#523


(image by Kenia Cris)


Em algum lugar na Coreia do Norte,
há um homem esperando uma carta
que eu nunca escrevi.

Eu me levanto,
ele assiste o pôr-do-sol
sobre o rio Taedong.

Ele come um tost-u no desjejum,
eu solfejo uma canção de volta pra casa.

Ele enterra um ditador,
eu trabalho no jardim.

Eu apago as luzes,
ele olha pela janela.

Em algum lugar na Coreia do Norte,
esperando uma carta que eu nunca escrevi.


Somewhere in North Korea,
there is a man
waiting for a letter I never wrote.

I wake up,
he watches the sunset
over Taedong river.

He eats a tost-u for breakfast,
I hum a song
on my way back from work.

He buries a dictator,
I work in the garden.

I turn off the lights,
he looks out a window.

Somewhere in North Korea,
waiting for a letter I never wrote.


---
Kenia Cris

Saturday, December 10, 2011

#522

(image by Anna)

O que há com as pessoas que
precisam tocar suas feridas para
ter certeza de que você é real
e então
fazê-lo chorar para ter certeza
de que você é humano?

What is it with people that
have to touch your wounds
to make sure you're real
and then
make you cry
to make sure you're human?



Friday, December 9, 2011

#521


(image on DeviantArt)


Quando eu encontrar
o meu lugar no universo.

vou guardar uma parede para você:
as cartas de amor que me escreveu
vão cobri-la.

Os postais,
os cartões de natal,
as anotações em guardanapos,
a foto de você usando óculos engraçados.

Num canto no chão,
a caixinha de música vai tocar
nossa canção há muito perdida
e a bailarina que eu não fui
vai dançá-la para você.


When I find my place in the universe
I'll save a wall for you,
the love letters you wrote will cover it.

The postcards,
the christmas cards,
the notes written on napkins,
the photo of you
wearing funny glasses.

On the floor in a corner,
the music box will play our song
long lost and forgotten and
the ballerina I wasn't will dance it
for you.


(Here's the ballerina I wasn't)
posted to dVerse

Wednesday, December 7, 2011

The astronaut

(image by Leticia)


The night I learned you had lifted off,
I laid awake in bed in my favorite
flannel PJs - the ones with the moons
and rockets you always made fun of
and I refused to throw away because
they made me feel a little closer to
being the astronaut I always wanted to.

I laid awake in bed studying the
peeling paint on the ceiling, patched
with fading stars we sticked together,
one of us floating in zero gravity
and the other giving instructions
on where each of them should be placed
according to a printed quadrant diagram.

Well, a thought crossed my mind then
that would take another 76-year period
to be be visible to the naked mind's eye
again: I would have to fix things all by myself,
my sky falling down, I might need to fight
my fear of heights and borrow a ladder,
a rocket, a spaceship or an umbrella.

I might need to fight my fear of heights
and my fear of love to reach for my stars
so they could have the chance to make it to wishes
so I could have the chance to come true, all by myself.
You see, I needed no help, and you may think of it
as one small step for a man, but it looks like
a giant leap for this woman here.

(PS.: I miss the talk of nebulas and meteors and I do miss the feeling of sharing galactic coordinates and constellations, but like the moon, I've gotten used to living with my phases, I'm learning my path unhurriedly, and I'm fine with being alone.)





A few notes of interest:

- This is an experimental poem in an experimental tone, it's 3:30 in the morning and I would like to read it but I'd wake up the house, so I may come back when the sun is up with an update.

- Because I'm trying to make blogging simpler, I'm bringing everything from my other poetry blogs into this one. This poem doesn't sound any nicer in Portuguese, reason why I didn't include a version.

Monday, December 5, 2011

#520


(image by Simon)

Cresci um centímetro hoje
antes da entrada do sol
em sagitário
e todas as surpresas.

Fechei os olhos e num único fôlego
desejei ver as pessoas mais devagar,
desejei ser eu mesma e vê-las
em retratos daguerreótipos.

Contei os anos
nos tijolos nas minhas paredes:
elas estão caindo
e ainda não consigo tocar meus sonhos
- mas estou crescendo.


I grew up a centimeter
at some point today,
between the sun
entering saggitarius
and the surprises.

I closed my eyes and on a lungful of air
I wished not to see people so fast,
to be myself and see them as they are,
in daguerreotype portraits.

I counted years
in the bricks of my walls:
they're falling down,
I still can't touch my dreams
- but I'm growing up.



Posted to dVerse


Thursday, November 24, 2011

:: Promessa ::

Eu sonhei com você uma última vez
e beijei-lhe o rosto antes de ir embora;

tive vontade de dizer:
haverá outras vidas além dessa,
meus olhos serão os mesmos
e buscarão os teus outra vez

- promessa.


--
Kenia Cris




Tuesday, November 22, 2011

#518



Gostaria de tê-lo conhecido antes, Henri,
quando havia tanto barulho que
não podia tocar a vida sem
aproximar-me demasiado da histeria.

Gostaria de tê-lo encontrado por acaso,
Pelo menos meio acordada,
enquanto capturavas o devir
e suas pessoas dançantes,

a vida desenrolando-se
diante dos teus olhos,
a vida permanente,
a vida fluida.

I wish I had met you before, Henri,
when life was too noisy and I
could not touch it without
getting too close to hysteria.

I wish I had accidentally run into you
on the street, at least half awake
while you framed the becoming
and its dancing little people,

life -
unfolding before your eyes,
permanent life,
fluid life.


Tuesday, November 15, 2011

#517

(image by alma)

Noite passada sonhei um poema
que gostaria de lembrar agora.

Eu vi o seu rosto
entre peixes amarelos flutuantes
e tijolos derretidos.

Você tinha um terceiro olho cego,
piscou ele pra mim enquanto pendurava
as páginas desaparecidas do meu diário
no varal,

uma delas o poema
de que não me lembro.


Last night I dreamed of a poem
I wish I could remember.

Among yellow floating fish
and melted building blocks
I saw your face.

You had a third eye blind,
you blinked it as you hanged
missing pages of my diary
on the washing line,

one of them
the poem I can't remember.

Monday, November 14, 2011

#516


(Hydra Constellation - image in allthesky.com)

Deitada no escuro,
cubro o rosto imortal
para que não me percebam o choro.

Quem pode lidar com os pensamentos
quando se tem uma centena de cabeças?

Lutei com monstros que não
podia vencer por um lugar
entre as estrelas onde os seus olhos
pudessem me alcançar nas noites claras.


I lie awake in the dark blue
covering my one pair of immortal eyes
so nobody will see me crying.

Who can deal with thoughts
when one has a hundred heads?

I fought monsters I couldn't defeat
for a place among the stars where
your eyes could meet me in the bright nights.


Friday, November 11, 2011

#515


(image by Becky)

Você vai de porta em porta
vestindo o seu melhor sorriso
e oferece uma variedade de
frasquinhos do amor capaz
de curar o mundo de suas mazelas.

Sentada no meu canto,
eu te observo e
me pergunto se
quando a noite cai
e você volta cansado pra casa,

não gostaria de ter guardado
um pouco para si próprio?

You walk from door to door
wearing your best smile and
offer a choice of love in tiny
bottles said to cure the world
of all sorts of misery.

I sit in my corner and watch
you. And I wonder: when the
moon is up and you crawl back
home, don't you wish you had
kept some love for yourself?


Thursday, November 3, 2011

#514


(image by Lothar Adamczyk)

É sobre os espaços vazios.


Sobre um homem que
sobe e desce escadas
pela mulher que ama,
carregando um copo d'água
e comprimidos
que ele certamente desejou
pelo menos uma vez
que fossem feijões mágicos.

É sobre como a vida escapa de
nossos corpos,

inevitável
sorrateira
silenciosa

e sobre ter mãos fracas
apesar da vontade forte.

É sobre os espaços vazios
depois que você vai embora,
e o silêncio que deixa para trás.



It's about the empty spaces.

It's about a man going up and down
the stairs for the woman he loves
with a glass of water and pills
he might have wished at least once
they were magic beans.

It's about life escaping our bodies

inevitably
smoothly
silently

and about us having weak hands
in spite of our strong will.

It's about the empty spaces
when you're gone,
and the unsettling silence left behind.



(To Steve F.)

Wednesday, November 2, 2011

I choose number one

Reason tells me which doors to open,
which doors are worth unlocking
and which doors are not doors.

Love is not going to trick me again.

Monday, October 31, 2011

#512


(Image by Felipe Dunley)

Ao nascer do sol
eu pertenço à terra,
eu sou um com o deserto -
meus primos e eu contra estranhos.


At sunrise
I belong to the earth,
I am one with the desert -
my cousins and I against strangers.


(To Felipe Dunley on the occasion of his birthday)

(About Bedouin)

Tuesday, October 25, 2011

#511


(Image by whisperinwater)


Foi o rosto empoeirado
de um sobrevivente
retirado dos escombros do que
outrora fora uma cidade

ele me fez lembrar de uma ocasião
durante outro terremoto
em que toda a minha atenção foi
dirigida aos pés da Cordilheira do Touro
no Vale do Rio Eufrates

onde você guardava
o meu coração
numa velha lata de café
dentro do armário.


It was the dusty face of a survivor
pulled from beneath the moulds
of what once was a city

it reminded me of my full attention on
the occasion of another huge earthquake
directed to the Euphrates Valley

where my heart used to sit
at the feet of the Taurus Mountains
in an old coffee can inside your cabinet.



Saturday, October 15, 2011

:: Fôlego ::

A mão a correr sobre o papel
produz um poema apressado
que sem fôlego
diz nada.

Sunday, October 2, 2011

#508


(image by Vintage Republik)

O céu de baunilha
e a memória
dos poentes
prometidos,
próximos o bastante
para tocar o silêncio
um do outro, na
última conversa honesta.

Amor,
uma lista
de coisas para fazer
de mãos dadas
segurando o fôlego:
uma conversa com as estrelas,
uma valsa com vagalumes,
um barquinho de papel
para seguir um mapa do tesouro,
na última conversa honesta.


Vanilla sky and
the memory of
the sunsets we've
promised to
watch together,
sitting close enough
to touch each other's
silence, last time we
spoke honestly.

Love,
a list of things to do
holding hands
and breath:
conversing with stars,
dancing with fireflies,
a paper boat to follow
a treasure map,
last time we
spoke honestly.



(posted to Poets United)

Tuesday, September 20, 2011

Stillness

I wasn't the one
who closed that door
and left the other behind
to get used to absence
and lonely spaces.


Sunday, September 18, 2011

#506

(image by Daria)

Eu ando pela cidade
mas sempre acabo
aqui.

Venho ao teu portão
e grito o teu nome
quarenta e nove vezes.

A noite responde com cachorros,
vou embora antes que os vizinhos
acordem.

Minha voz tão fraca,
tua janela tão distante,
você.

I wander through the city
but my feet always bring me back
here.

I come to your door
and scream your name
forty nine times.

Night replies with dogs,
I leave not to wake up
neighbors.

my voice so weak,
a window so distant,
you.


Thursday, September 15, 2011

#504


(image by stachelpferdchen)

A minha versão corajosa
com armadura completa
e espada em punho,
mataria os monstros que habitam
as sombras que as suas mãos
fazem quando se movem pelo papel,
a minha versão corajosa

- quer fossem tão altos quanto sequóias
ou tão concretos quanto moinhos de vento.


The brave-hearted me,
dressed up in shiny armor,
sword in hand,
would duel and slay
the monsters inhabiting
the shadows
your hand makes on paper
while you write,
the brave-hearted me.

It wouldn't mind them
being as tall as the tallest trees
or as concrete as windmills.

#503


(A street in Arles, image by arasam22)


Tive que fazer mais do que
sentar-me em sua cama
e estudar suas paredes
e cadeiras para perdoar
Vincent.

A falsa quietude
predominante nos móveis,
retratos e roupas
usadas para responder
a qualquer pergunta

A janela empoeirada
para uma alma tão partida
que seus pedaços
não pertenciam mais
juntos,

tive que ir até lá
e abri-la
e deixar o meu coração
na soleira com um bilhete que
ele talvez gostasse de levar no bolso.


I had to do more
than go and sit on
his bed and study
his walls and chairs
to forgive Vincent.

The fake steady rest
all over the furniture
faces and costumes
he'd wear to answer
whatever questions

the dusty window
to a soul so badly
broken no one
could put pieces
back together

I had to go and open it
and place my heart on the
windowsill along with a note
he might like to keep in his
pocket and carry around.





Tuesday, September 13, 2011

#502


(image by G-R-E-T-A)


Ganhou e perdeu
guerras de balões d'água
a criança que eu fui.

Risos eram
os espólios que todos
carregavam para casa.

Lost and won
water balloon battles,
the child I once was.

Laughs were assets
everyone could
carry home.






Sunday, September 11, 2011

Sealed

Last
time
carries
no
love.

#501


(image by John Myers)

Onde você estava
quando o terror cobriu o mundo
com 15 centímetros de poeira
e nuvens de fumaça?


O sonho de voar
as palavras não ditas
o último pedido
o céu pela última vez

- nunca mais a primeira.



Where were you when
horror covered the world
with 3-inch-thick dust
and clouds of smoke?

The dream of wings
the words not said
a last wish
the sky for a last time

- never again firsts.


(posted to dverse and imaginary garden with real toads 9/11 memorial - 10th anniversary)

Friday, September 9, 2011

#500


(image by deep_south88)

Essas linhas
não se traduzem.

Doze leituras diferentes
do mesmo coração
ainda falham em explicar

os espaços quietos e solitários
nas horas ruidosas que nos separam.

These wavy lines
don't translate into
words

twelve different readings
of this heart
fail to tell you

of the lonely stillness
in the thundering hours
between us.

Tuesday, August 30, 2011

#499


(image by Julie de Waroquier)

Eles têm tudo escrito
e sabem exatamente
como vai acontecer.

Publicaram trabalhos científicos
sobre vidas poéticas
mortes trágicas
verdades incompreensíveis.

Eles dizem que vou morrer
por minhas próprias mãos.

Porque sou uma escritora.
Por causa da minha escolha de pronomes.
Por causa de mecanismos
confusos
na minha cabeça.

Eles dizem que vou morrer
como Sylvia,
como Anne,
como Virgínia,
Como Alejandra.

Mas eu vou morrer
como a mulher que sou.


They have it all determined
They know exactly how it will happen.
They’ve published scientific papers on poetical lives,
tragic deaths,
incomprehensible truths.

They say I’ll die by my own hands.

Because I’m a woman writer
Because of my pronoun choice
Because of something inside my head
they cannot tell or
understand.

They say I’ll die
like Sylvia,
like Anne,
like Virginia,
like Alejandra.

But I’ll die like myself.






(posted to dVerse)

Sunday, August 28, 2011

#498


(image by Codri)

Caminho no escuro
entre as multidões de fantasmas
- eles não mais me incomodam.
Porque desconfio,
vim até aqui
sozinha.
Porque minhas mãos
não encontram paredes,
esses joelhos escalavrados.

I walk in the dark among
the crowds of ghosts
- they no longer bother me.

because I don't always trust
the particular touch,
I allowed no one to lead me here.

because I grope for walls
and can't find them,
I have these bruised knees.

Friday, August 12, 2011

#497

(image by machitamami)


Dobro o tempo em
mil Tsurus

e os observo ganhar vida,
voar para longe

carregando meu desejo
em suas asas.

I fold time into
one thousand Tsurus

and watch them
as they gain life
flying away
in the distance

carrying my wish
on their wings.


Sunday, August 7, 2011

#496


(image on StumbleUpon)

Quando é outono e eu

saio para uma caminhada longa
espero que você me encontre.

Céu de baunilha
o vento brinca com as folhas das árvores
e olho da minha imagem refletida
na água para a estrada à frente.

Eu sei que você caminha devagar,
mas pela primeira vez em anos
meu coração está tranquilo.


When it's autumn and I
go for long walks alone
I don't expect anyone
to find me but you.

Orange sky
the wind blows leaves off trees
I look from my reflected image
in the water to the path before me

I know
you walk slowly
but for the first time in years
my heart is calm.

Tuesday, August 2, 2011

#495


(image by J.)

O milagre do amor
é aquele das coisas
cotidianas

das coisas que respiram
como o virar de páginas
e o abrir de janelas

de olhar o céu e
reorganizar as estrelas
para que elas tenham

os nossos traços.


the miracle of love
is that of
everyday things

of breathing
turned pages
and open windows

and rearranging stars
in the sky
so they carry our lines.


Sunday, July 31, 2011

#494


(image by Janusz Miller)

Eu respiro devagar
e encontro o silêncio

e o que não é silêncio
já não mais
me alcança.

I breathe slowly
and find silence

and everything that
is not silence
can't reach me.

Friday, July 22, 2011

Experience

It hurts
so you know
you have a heart.

#492

(image by Carmi)


Se houvesse um poema de esquecer
não seria esse.

Esse é um poema de lembranças
por onde sempre correrão meus dedos

de sonhos enlatados
de olhos fechados
de bolhas de sabão
de ter um coração

num dia de chuva.


If there was a poem to forget
it wouldn't be this one.

This is a poem to remember
its lines will always meet my fingers

a poem
on closing my eyes
and having canned dreams
and soap bubbles
and a heart

on a rainy day.


(Posted to Poets United )