Sunday, July 18, 2010

:: Carta aberta ao homem do passado ::

Querido homem do passado,

Eu sinto muito a sua falta, todos os dias, mas às vezes um pouco mais. Quando nos conhecemos, você veio andando em minha direção no escuro e então transformou tudo em luz. Quando você foi embora a luz se apagou, e junto com ela a lua e as estrelas - a noite nunca foi tão assustadora. Sinto falta de longas conversas ao telefone, de abraços eternos em que ninguém se solta, de mãos dadas, de carinho despretensioso, dos seus olhos, da sua risada, de você deitado no meu colo olhando o céu e falando de livros, arte, da vida.

Nossas vidas mudaram muito no último ano, tivemos que aprender a lidar com ausências e presenças, com o inverno da alma, e as consequências das escolhas que fizemos. Crescemos separados. Abrimos as portas para outras pessoas, falamos cada vez menos um com o outro, um do outro, embora nossas lembranças e pensamentos não nos abandonem. Unidos por girassóis, botões, elefantes, filmes, teatro, livros, céus, nuvens, estrelas, risadas; separados por um oceano, um fuso horário, o cotidiano frio e impessoal. Eu tenho medo de nunca mais sermos o que éramos. Tenho medo de nos tornarmos estórias que contaremos aos nossos filhos e netos, apenas estórias com finais inevitavelmente estranhos e incongruentes, nada mais.

Beijo carinhoso.
Sempre.


9 comments:

  1. Kenia, a sua carta aberta têm asas brilhantes e alcança distantes e verticais endereços. Bonito demais!

    Beijão.

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  2. Acho que eu não tinha visitado este teu blog...
    Lindo em tudo!!
    Com relação ao texto... acho que não há um ser que não vive um instnte desta dúvida, deste medo...
    Lindo ver ele escancarado assim...
    adorei!
    ;D

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  3. nossa, você aplicou um outro estilo ao seu mundo de letras brilhantes. Adoro seusa medos, compartilhe cada vez mais!

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  4. Carta aberta com remetente certo.
    Meu comentário só poderia ser passageiro...
    Emocionante.

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  5. Oi Kenia!
    Sabe que li essa carta no dia em que vc postou, mas fiquei pensando nas coisas que ela me provocou... E o que mais me pirou foi o fato de que talvez seja inevitável 'ser o homem do passado', e as coisas serem diferente do que eram, mas o que fazemos com as lembranças e com as expectativas que não vão embora somente por ser ele um homem do passado...
    Beijo grande!

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  6. Kenia, foi flecha certeira...acertou-me em cheio bem onde está vazio...

    um beijo

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  7. Eu quero abraços e abraços eu quero a poesia de Kenia Cris na minha vida, eu quero ser o homem do passado, eu quero ser o a precipitada chuva a precipitar-se sobre tão torta poesia. ^^ Te dollu

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  8. Olá, desculpe invadir seu espaço assim sem avisar. Meu nome é Fabrício e cheguei até vc através do Blog Teatro da Vida. Bom, tanta ousadia minha é para convidar vc pra seguir meu blog Narroterapia. Sabe como é, né? Quem escreve precisa de outro alguém do outro lado. Além disso, sinceramente gostei do seu comentário e do comentário de outras pessoas. Estou me aprimorando, e com os comentários sinceros posso me nortear melhor. Divulgar não é tb nenhuma heresia, haja vista que no meio literário isso faz diferença na distribuição de um livro. Muitos autores divulgam seu trabalho até na televisão. Escrever é possível, divulgar é preciso! (rs) Dei uma linda no seu texto, vou continuar passando por aqui...rs



    Narroterapia:

    Uma terapia pra quem gosta de escrever. Assim é a narroterapia. São narrativas de fatos e sentimentos. Palavras sem nome, tímidas, nunca saíram de dentro, sempre morreram na garganta. Palavras com almas de puta que pelo menos enrubescem como as prostitutas de Doistoéviski, certamente um alívio para o pensamento, o mais arisco dos animais.


    Espero que vc aceite meu convite e siga meu blog, será um prazer ver seu rosto ali.


    Abraços

    http://narroterapia.blogspot.com/

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